Querides, tenho esbarrado em muitas histórias de brasileiras que saíram do Brasil e passaram por experiências de parto longe do seu país de origem e longe de familiares. Ao ouvir esses relatos, pensei que seria interessante dividi-los aqui no blog, até para uma comparação dos sistemas de saúde e suas assistências.
No mês passado, trouxe a história de parto da Joana, uma brasileira que se mudou para Portugal, gestando sua segunda filha e passou pela experiência de pré-natal e parto nesse país da Europa.
A história da Fernanda: parindo na Espanha
Hoje, trago a história da Fernanda, uma mulher que se casou com um espanhol aqui no Brasil e foi morar na Espanha, em uma comunidade há quarenta minutos de Madrid. Lá ela passou por sua segunda gestação e veio aqui contar como foi sua experiência.
Fernanda já é mãe da Sarah, uma jovem de 19 anos, e engravidou pela segunda vez na fase mais difícil da pandemia. Para quem lembra, a Espanha foi um dos países que sofreu muito com a pandemia da COVID-19, chegando a declarar estado de emergência. Foi nesse contexto todo que nasceu o Éric, bebê mais novo da Fernanda.
Fernanda conta que o pré-natal é muito diferente do Brasil, talvez pela época da pandemia, mas iniciou o pré-natal pelo convênio de lá e, surpreendentemente, relatou que o sistema público foi muito melhor que o particular. Ela percebeu isso nos exames de pré-natal, em que sentiu uma frieza da equipe médica nas relações médico/paciente. Ela diz que a medicina na Espanha é muito fria, sentiu falta do acolhimento caloroso que viveu no Brasil e que os partos preferencialmente acontecem de forma natural, podendo-se escolher tomar analgesia e ter o bebê na banheira caso você tenha desejo.
Na primeira consulta de pré-natal, ela estranhou a abordagem do médico, dizendo que ela tinha até quinze semanas de gestação para decidir se iria ou não seguir com a gestação e, caso não seguisse, precisaria marcar logo o procedimento para a retirada do bebê, o que assustou um pouco Fernanda, pois a gestação não foi planejada, mas era muito querida pelo casal.
Segundo Fernanda, o sistema funciona parecido com plantão, cada consulta/exame é feito com um profissional, então não se cria vínculo afetivo com nenhuma equipe.
Ela conta que teve uma doula e fez toda diferença tê-la no momento do parto.
No terceiro trimestre, acontece a visita aos hospitais, mostram toda a instalação das salas de parto natural, do pré-parto e ensinam como fazer o plano de parto, o que foi muito legal para a experiência do parto.
O trabalho de parto: atendimento considerado “bom”
No final da gestação, tive diabetes gestacional e, apesar disso, optamos em seguir o parto no sistema público, pois o foco era um parto natural. Durante o trabalho de parto, pude ter o acompanhamento do meu marido, mas precisei de uma cesárea de emergência e ele foi privado de estar comigo, precisou ficar em uma salinha esperando, me lembrou aqueles partos antigos de 1900. Quando a cesárea acabou, vi meu marido do lado de fora da sala segurando nosso bebê e chorando de emoção. Apesar de tudo, o atendimento ao parto no sistema público foi muito bom, fomos bem assistidos e ficamos em um quarto privado, o que é normal em hospital público por aqui, conta Fernanda.
O pós-parto: o abandono
No pós-parto, ela conta que sentiu-se abandonada, passou por dificuldades na cicatrização da cesárea e só conseguiu uma única consulta com a matrona (parteira), talvez pelo momento da pandemia, acrescentou.
A rede de apoio nesse período foi difícil, a filha mais velha, na época com quinze anos, sentiu bastante por ter sido sempre só as duas e de repente em um país diferente, longe dos amigos, ela ficou mais ciumenta com a chegada do irmão, chorava muito de saudade das pessoas do Brasil.
Nossa rede de apoio se baseou em contato restrito com a sogra e cunhada, com a família e amigos por via vídeo e com você Lili, que me ajudou muito quando tive problema na amamentação.
Hoje o Éric está com quatro anos e é um menino ativo, muito traquina, e apesar de ter tido muito medo por tudo que passamos, foi uma experiência incrível, o Covid foi a prova final para nossa família, a certeza que queremos ficar juntos, pois ficamos confinados em casa por três meses e fomos rede um para o outro.
Um ponto que tive dúvida e achei bacana perguntar para Fernanda era sobre o parto domiciliar, se era um recurso via sistema público e ela me respondeu que não é muito comum esse tipo de parto e que, para passar por um parto domiciliar, precisa contratar equipe particular, o que é extremamente caro, pois o foco é o incentivo à saúde pública.
Sim, precisamos valorizar o SUS
Fernanda termina a entrevista dizendo que precisamos valorizar muito a saúde pública do Brasil, ela tem uma amiga brasileira que é enfermeira em Madrid e diz que nossa saúde é um exemplo para outros países, que muita gente acha que a saúde pública fora do Brasil é melhor que a nossa, mas a nossa é muito bem estruturada perto de outras nacionalidades e adiciona um: Viva o SUS!!!
Agradeço a Fernanda por ter dividido sua história conosco, grata, grata, gratíssima!
Se você passou por um parto fora do Brasil e quiser ajudar nessa série, mande um email para lilidoulasp@gmail.com
Um beijo da doula!